OLAAAAAÁ :)
Como estamos nas
leituras, hein? Pra quem não era de muitas metas, até que estou conseguindo
estabelecer e seguir algumas \o/ Mas vamos ao especial do dia, temos duas
convidadas para nossa primeira entrevista de leitura do ano!
Aqui no Littera gosto de, além de trazer temas para discutir com vocês, convidá-los para um papo sobre suas leituras. Dessa maneira, partindo de uma leitura específica, o espaço de entrevista propõe um jogo de perguntas que pretendem trazer à baila perspectivas que nos mostrem os bastidores de uma experiência de leitura.
Já tivemos um encontro
com Hemingway, Kafka, Érico Veríssimo e hoje saudamos Clarice Lispector, mais
uma modernista brasileira!
De relembrete, vão aí
os requisitos para quem gostaria de participar de uma entrevista aqui no
Littera:
Leitura de um clássico da literatura
(nível mundial)
Leitura recém-finalizada
Não valem releituras
~~~~~~~~~Vamos conhecer
mais de nossas convidadas?~~~~~~~~~~~
No
microfone de leitor apresento...
Recém-formada em
Letras/Literatura, mãe, blogueira (resenhista/colunista/escritora) e MUITO
leitora.
Aos
5 anos aprendi a ler. Aos 10, quando a mamãe não dava conta de comprar livros e
gibis infantis que acompanhassem o meu ritmo frenético de leitura, comecei a
ler os clássicos que minha avó tinha e que hoje são meus, estão velhos e
despencando, mas a memória afetiva neles envolvida não dá pra substituir. A
partir daí, virei um caso perdido mesmo. Hoje em dia leio de tudo: clássicos,
contemporâneos, estrangeiros e nacionais – de Chico Buarque a Harry Potter... e
sinto uma necessidade daquelas de dizer o que penso a respeito do que leio.
Sonho em um dia, quem sabe, seguir carreira na área editorial e enfim dizer: -
Vivo daquilo que amo.
Busco
na leitura diferentes visões de mundo, por isso penso ser tão aberta a
diferentes estilos literários, porque enxergo que cada um tem algo a
acrescentar, mesmo que seja a leveza da distração momentânea em um dia difícil.
E que por mais que determinado segmento literário não faça muito a sua cabeça,
ele é a manifestação artística de alguém, e assim deve ser encarado.
E
na bancada de leitura encontra-se...
A Hora da Estrela, de Clarice Lispector.
Dados complementares
Edição (editora e ano
de publicação): Rocco, 23ª edição, 1993.
Época de enredo: século
XX.
~~~~~~~~~~~~~~Eis
Milena e Clarice! ~~~~~~~~~~~~~~
meus
comentários estão em itálico
Conte
para nossos leitores as suas perspectivas iniciais sobre o livro e a história
que A Hora da Estrela apresenta.
Bem, esse não é um
livro fácil de ler. Em algumas edições há um longo, porém válido, prefácio. E a
questão do narrador criado por Clarice Lispector é outro elemento instigante...
Rodrigo narra Macabéa e sua vida vazia, mesclando desprezo, indignação e
curiosidade, de como alguém consegue viver da forma de Macabéa.
A minha perspectiva
inicial foi de que a falta de história pessoal de Macabéa é um grito de alerta
para todas as mulheres, para que não acabem como ela. E não é uma obra
machista, como já li em algumas críticas.
Uma
coisa interessante de fato mesmo é o Rodrigo S.M., o narrador. Acho que ele via
a dura realidade de uma pessoa inocente como a Macabéa, que tinha gente que vivia
mesmo daquele jeito...
O
que te levou a A Hora da Estrela por agora? Já havia lido algo de Clarice
Lispector antes?
Eu já havia lido faz um
tempo, mas fora no primeiro período da faculdade para uma disciplina chamada
Modernidade e Literatura Brasileira. Achei confuso, porém muito original. Daí
no último período foi solicitada a leitura para outra disciplina, Literatura
Comparada, e a impressão que tive da obra foi tão além da que tive na primeira
leitura.
Um novo olhar, sabe, as
questões filosóficas propostas por Rodrigo já não me soaram tão sem pé nem
cabeça. Senti juntamente com ele as agonias pela ingenuidade excessiva de
Macabéa e a indignação pela falta de atitude.
Foi a primeira obra da
Clarice que li, mas quero ler outras. Só que são daqueles livros para se ler
com calma, degustando, voltando as folhas em alguns momentos.
Professores diferentes
solicitaram a mesma leitura, numa diferença de três anos. E eu resolvi reler,
porque imaginei que me “diria” coisas diferentes.
Nesse
momento percebemos as duas (eu e Milena) que estávamos falando já de uma
releitura, que, segundo os requisitos da coluna, não vale hahaha Mas sem
problema, embora a Milena tivesse outro livro de primeira viagem para propor,
abri essa exceção porque estava curiosa sobre essa experiência de leitura,
afinal, Clarice é Clarice, a chamada esfinge divide opiniões... Por que não,
né?
O
que diria sobre seu avanço na leitura? De que maneira a escrita ou a narrativa
da autora influenciou nesse quesito?
Eu sou uma pessoa que
lê rápido, dificilmente demoro lendo uma obra, mas esse... rsrs Me
desconcertou. Demorei porque tinha momentos em que eu lia e refletia, e não
conseguia chegar a uma conclusão. Daí eu voltava a página e lia novamente.
Acho o traço estilístico
da Clarice muito particular e a narração de Rodrigo não nos esclarece muito,
fora os momentos do choque pela rispidez dele ao falar de Macabéa... Tinha
horas que eu sentia tanto pela ela. Pensava nos “e se...”. E se Macabéa tivesse
encontrado uma única pessoa em seu caminho que a esclarecesse. E se não tivesse
sido criada da maneira que foi, imersa na ignorância e no desamor, e se não
tivesse ido à cartomante.
Acho
que principalmente pela desconstrução narrativa da Clarice as pessoas sentem
essa dificuldade. Você chegou a ver o filme? Já não lembro muito, mas dava essa
empatia pela Macabéa. A ingenuidade dela ficava bem à mostra.
Sim, eu vi... Fiquei
angustiada. E o mais engraçado, a história não saía da minha cabeça (rsrs)
Lembro que eu fazia um curso na área nobre da minha cidade e na hora que eu fui
atravessar a rua, uma Mercedes estava parada no sinal (rsrsrs) Ri sozinha e
esperei a Mercedes passar, preferi não correr o risco.
Hahahahahahaha
entendedores entenderão XD
Tem
uma cena que ela está muito perto do metrô, se não me engano, aí um policial
pede pra ela se afastar, pra evitar uma queda, e ela diz “o senhor me
desculpe”. Ela falou isso outras vezes mais no filme, era outra marca dessa
ingenuidade dela, que baixava a cabeça e acatava simplesmente o que lhe diziam.
E de alguma forma era feliz.
Pois é... Rodrigo a
chamava de “doce obediente”.
E
sobre a história, o que você achou do desenvolvimento? Personalidades, ações,
ideais?
Tem uma parte que me
deixou bem chocada: “Essa moça não sabia que ela era, assim como um cachorro
não sabe que é cachorro. Daí não se sentir infeliz”. Vejo como uma obra que tem
por fio condutor as questões filosóficas individuais, que refletem e determinam
a forma como o coletivo vê a cada um de nós.
Porém, as misérias dos
demais personagens não são diferentes da miséria de Macabéa. Olímpico de Jesus
era tão alheio a alguns saberes quanto ela, porém, a postura que ele tinha
mediante as situações e a forma como nutria ambições faziam dele uma pessoa
que, apesar de tão miserável quanto Macabéa, era muito mais autônoma.
É
chocante a descrição do Rodrigo, e ao mesmo tempo verdadeira.
Lembro
do Olímpico como alguém da mesma situação da dela, mas alguém que tinha
ambições mais. Macabéa era bem conformada com o que tinha, apesar de seus
sonhos.
É que a ingenuidade de
Macabéa veio do vazio, da ignorância com a qual foi alimentada. Já Olímpico
teve um padrasto, que no livro fala, que lhe ensinara boas maneiras para poder
enganar as pessoas e para pegar mulher (rs).
Houve
algum momento marcante entre você e a leitura? O que diria ser uma repercussão
positiva e uma repercussão negativa em A Hora da Estrela?
Muito marcante pra mim
é a questão dessa ausência emocional da Macabéa. Essa coisa de viver sem saber
pra quê. Penso que é porque entra em conflito diretamente com a minha
personalidade. Desde muito nova busco construir minha identidade. Não aceito
muitas coisas e já perdi por isso. Mas também adquiri valores que são as
diretrizes da minha vida. E confesso que quando me deparo com algum(a) Macabáa,
fico aflita por ele(a). Nada pior do que não saber quem somos.
A positiva sem dúvidas
é o convite à reflexão que a obra em si traz para o leitor, tanto nas questões
filosóficas quanto na questão de estrutura sintática e semântica da escrita da
autora. A negativa é que tamanha densidade faz com que muitos desistam da
leitura, infelizmente... E acho bastante difícil que se consiga compreender a
obra sem uma bagagem de leitura prévia. Alguns leitores vão persistir nele,
enquanto outros vão colocá-lo na prateleira dos “confusos demais” e vão perder
uma leitura única. Que nem sempre agrada, mas, é válida.
É
mais ou menos nisso que fica minha relação com Clarice. Fico tentando
entendê-la como a esfinge que dizem, e ela não me dá muita brecha (rs
http://www.dear-book.net/2013/11/littera-feelings-5-unnamed-feeling.html).
Tenho admiração por ela, mas é como gostar da ideia dos livros, só não da
maneira como leva.
Você
consegue imaginar como a protagonista seria se ela vivesse o nosso tempo? O que
seria de Macabéa nesse mundão da internet?
Acho que das duas uma,
8 ou 80: ou a Macabéa seria engolida ou então seria uma dessas que causam muito
na internet pela total falta de noção. Porque no livro ela se esconde, mas a
internet dá voz pra quem quiser, sem dar a cara a tapa de verdade.
Já pensou a Maca
fazendo aqueles virais? (rsrs)
Bem
capaz!
Se
você pudesse entrar no universo da trama, quem você gostaria de ser (não necessariamente
um personagem da Clarice) e o que faria por lá?
Ai, que pergunta
difícil! O livro é o que é porque não é mais e nem menos... Mas também não iria
ver Macabéa passar por mim sem que ao menos tentasse ensiná-la algumas coisas
(rsrs). Assim, eu gostaria de ser uma colega de trabalho que a consolaria por
causa de Olímpico. Aproveitava e dava uma bela sacudida na Macabéa... E
consequentemente acabaria com a razão de ser do livro (rsrs).
Hahahaha
ou daria chance para ser outra estrela... Outro tipo de estrela.
(Novamente,
entendedores entenderão XD).
Nem tinha pensado nessa
possibilidade!
Há
alguma música (ou banda) que venha à mente quando você pensa na história, na
Clarice ou mesmo no universo da Estrela?
Só a Rádio Relógio
(citada no livro). Acho que o mundo da Macabéa era sem som.
Tadinha.
Pois é, me dava uma
pena, mas...
Tem
algum trecho que te conquistou bastante e queira dividir conosco?
“Ela me incomoda tanto que fiquei oco. Estou oco dessa moça... Como me compensar? Já sei: amando meu cão que tem mais comida do que a moça. Por que ela não reage? Cadê um pouco de fibra? Não, ela é doce obediente.”
“... ela somente vive, inspirando e expirando, inspirando e expirando... O seu viver é ralo.”
Esses dois para mim
foram os mais marcantes porque me chocam.
Para
finalizar: o livro é legal, mas...?
É só para os fortes,
principalmente os de estômago, porque a inércia de Macabéa chega a ser
nauseante.
Hahaha
melhor definição!
Eu
brigava com Rodrigo, com Macabéa. Ou com Clarice.
Encarar
Clarice não é para qualquer um.
Sério (rs). Achei meio
clichê, mas não consegui pensar em outra coisa (rsrs) E de verdade, tinha hora
que esse livro me irritava tanto que me dava vontade de dar uma cusparada
daquelas bem feia nele haha. O prefácio dizia “alguns têm pobreza de dinheiro e
outros de caráter” – (rsrs) sente o drama. Mas bom também, fala que a nossa
consciência ao mesmo passo que é fator de libertação também é de
aprisionamento, e fala muito do ato de escrever.
~~~~~~~~~~~//~~~~~~~~~~~
E
aí, o que vocês dizem da tia Clarice? Ou mesmo do livro da entrevista?
Conhecida como aquela
que dá atenção ao íntimo do ser (através do fluxo de consciência) para dar a
sensação de que podemos acompanhar exatamente o passo a passo da cabeça do
personagem, não à toa viraliza fácil
com outros memes que focam nos pensamentos ligeiros nossos dos dia a dia.
Epifanias (momentos de revelação) então, nem se fala!
Dona de muitas frases
espalhadas pela internet (e até das que não lhes pertence na realidade...),
Clarice foi um dos destaques do terceiro momento do Modernismo Brasileiro.
Nessa fase tivemos um desapego às circunstâncias exteriores e uma valorização
da palavra e do texto, o que contribuiu para tornar alguns escritos difíceis de
serem compreendidos. Lispector, nesse sentido, tem seus lovers, tem seus haters,
e tem seus meios termos. É, por certo, uma escritora inquietante.
Além de crônicas e
livros infantis, escreveu
(romances)
Perto do coração
selvagem (1944); O lustre (1946); A cidade sitiada (1949); A maçã no escuro
(1961); A paixão segundo G. H. (1964); Uma aprendizagem ou O livro dos prazeres
(1969); Água viva (1973); A hora da estrela (1977).
(contos)
Alguns contos (1952);
Laços de família (1960); A legião estrangeira (1964); Felicidade clandestina
(1971); Imitação da rosa (1973); A via-crúcis do corpo (1974).
A Hora da Estrela é um
dos livros mais conhecidos e foi o último escrito antes de morrer. O livro teve
doze outros títulos até se firmar em A Hora da Estrela. (leia mais sobre isso neste artigo, página 2).
Habemus Filme! E Habemus Série!
De 1985, o filme tem no
elenco Marcélia Cartaxo, José Dumont, Fernanda Montenegro e Tamara Taxman. Sobre ele que comentamos nesta entrevista. O
trailer vocês podem ver aqui e há
um canal do Youtube que disponibiliza filmes antigos brasileiros :)
Nossa tv também fez
especiais. Em 2003, Regina Casé e Wagner Moura apresentaram uma pequena série
chamada Cena Aberta que focava em desconstruir uma história e mostrá-la de maneira mais panorâmica, como um documentário
que enfatiza testes, produção, pesquisa e roteiro literário. O episódio sobre A
Hora da Estrela vocês podem ver aqui (contém spoilers!).
Espero que os leitores
tenham gostado. Eu e a Milena curtimos muito esse bate-papo!
A propósito, obrigada pela participação, Milena!
Interessados em
participar de uma entrevista, dentro dos citados requisitos, só mandar nome, um
contato de rede social (FB ou twitter), o nome do livro e do autor para
marykleris@hotmail.com, assunto Littera Feelings.
Até o próximo post,
Kleris Ribeiro.
Olá!
ResponderExcluirHaha, adorei a coluna ainda mais com essa incrível escritora em pauta. rs
Li esse livro ainda esse ano e também acho que a coitada da Maca seria engolida por esse mundo globalizado. rs
Beijo,
Samantha Monteiro
http://www.wordinmybag.com.br/
Talvez não houvesse outro destino mesmo... senão "a hora da estrela" rs
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