quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

Interrogação #2 – O blogueiro literário e a bibliodiversidade

Com Mary Leite, resenhista da casa


Interrogação é uma coluna do Dear Book que recebe convidados para refletir o nosso momento enquanto ideias, hábitos, panoramas e manifestos culturais. A cada post, uma pergunta e uma opinião. Todo o conteúdo de resposta é de responsabilidade dos convidados. Sem periodicidade fixa, a coluna é organizada pela dear boss, Kleris Ribeiro.


O que você acha sobre o papel do blogueiro literário de auxiliar na bibliodiversidade?

M: A primeira vez que chorei por um livro, foi lendo um conto de Oscar Wilde, chamado O Rouxinol e a Rosa. Sabe aquele choro soluçado, que te arranca o fôlego? Nunca me esqueci das caras assustadas dos meus pais, que vieram correndo do quarto ao lado, desesperados, acreditando que houvesse acontecido algo de muito sério comigo. Eu tinha uns dez ou onze anos e, naquela época, não tinha ideia de como isso voltaria a se repetir muitas e muitas outras vezes.

Em pouco tempo, zerei o acervo da pequena biblioteca da minha escola. Minha sede por leitura era insaciável e, percebendo isso, meus professores começaram a me emprestar livros. Por causa deles, conheci José de Alencar, Joaquim Manuel de Macedo e Machado de Assis. Aos doze, li O Morro dos Ventos Uivantes, sem jamais imaginar que se tratava de um clássico.

Descobri um tempo depois que a biblioteca municipal da minha cidade possuía um setor de literatura infantil, onde era possível tirar uma carteira para pegar livros emprestados. Não pensei duas vezes. Ali, tive a oportunidade de ler obras que marcaram minha infância, como A Princesinha, O Jardim Secreto e a coleção do Sítio do Pica-pau Amarelo. Tudo isso antes de terminar o ensino fundamental.

E neste momento, você que teve a paciência de chegar até aqui, deve estar se perguntando: qual é o ponto, Mary? Calma, gafanhoto. Eu chego lá. Como boa beletrista, não sei ser sucinta.

De certo modo, meus professores exerceram o papel de blogueiro literário para mim, dizendo: “Lê esse aqui, acho que você vai gostar”. Mais de uma década atrás não existia essa pessoa que lê e conta suas experiências literárias para pessoas desconhecidas, de certo modo influenciando em suas escolhas.

E talvez seja por isso que tenho tanto receio da responsabilidade com o público leitor. Pensar que a minha opinião pode influenciar na decisão de centenas de pessoas, é assustador. Pensar que você, ou um colega seu, pode desistir de ler um livro, porque eu, em minha humilde opinião, o classifiquei como ruim, é aterrador.

Dificilmente direi que não indico um livro. O fato de eu não gostar de uma ou outra obra não significa que você também não irá gostar. Em vez disso, especificarei a quem indico determinado livro, a partir do que você busca para ler no momento.

Fico pensando: E se alguém deixar de ler um livro que eu não gostei, quando, na verdade, ela teria gostado? No geral, quando não gosto de uma leitura, tento fazer uma reflexão sobre ela. Por que motivo eu não gostei? Até que ponto a razão de não ter gostado é realmente um defeito ou resultado de um gosto pessoal? E sempre – SEMPRE – tentarei explicar para o meu leitor o que me incomodou na trama, ressaltando as preferências pessoais que podem ter influenciado na minha opinião.

Se como influenciador, o blogueiro carrega certa responsabilidade para com seu leitor; como intermediário na relação escritor/leitor, esse contato nos proporciona conhecer novos autores e obras que, de outra maneira, não teríamos interesse de buscar.

Quando entrei no Dear Book, por convite da Kleris, recebi dois livros que me foram desafiadores: P.S. Eu te amo e Loucamente sua.

O primeiro, conforme expliquei na resenha, eu já conhecia e, inclusive, havia tentado ler anos antes. Por imaturidade, bloqueio ou o que for, não consegui finalizar a leitura. Mesmo hoje, não saberia sugerir uma razão para tanto. Não obstante, se não fosse pelo blog, talvez eu nunca tivesse me proposto uma nova tentativa.

Com o segundo, a experiência foi um tanto diferente. Quando recebi aquele pacote e li a sinopse do livro, torci o nariz. Preconceito literário? Talvez. Como mantenho certas reservas com relação a livros eróticos – acredito que também tenha mencionado isso na resenha – por conta não só da construção de algumas tramas, mas também pela forma como são vendidos; iniciei a leitura com dois pés atrás. E descobri que estava bastante enganada. Hoje, Rachel Gibson é uma das minhas escritoras prediletas.

No ano passado, tive a oportunidade de representar o blog Dear Book no Planeta de Leitores, integrando a mesa ao lado de uma autora que admiro muitíssimo e que, por sinal, só conheci por causa do blog. Além de uma imensa honra, sentar ao lado de Mary Del Priore e poder conversar sobre uma obra tão fascinante quanto Beije-me onde o sol não alcança foi uma experiência inspiradora. Inesquecível.

Foram muitas e muitas surpresas.

Acredito que essa bibliodiversidade reflita diretamente sobre meus leitores, porque, quando acompanhamos uma determinada página, acabamos por nos identificar literariamente com certo resenhista. E vislumbrar a chance de ampliar o leque – e os horizontes, talvez – de uma quantidade indeterminável de pessoas é impressionante.


Mary Leite é advogada, especialista em Direito Previdenciário e beletrista por amor. Fisgada desde cedo pela literatura, aventura-se pelo mundo literário, desde o lado da leitura ao lado de quem rabisca uma e outra história. Séries, novelas e resenhas são, dentre outros incisos, seus pequenos e grandes vícios. Intuitiva, deixa-se guiar por onde a curiosidade levar.

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Ana Liberato