Por
Kleris: Livros que tratam do lado
emocional do ser humano são como um tour
do buraco negro; é um tema que instiga, afinal, muitos mistérios da vida estão
escondidos neste campo do conhecimento. Já havia lido diversas abordagens sobre
emoções (ensaios sociais, biológicos, científicos, behavioristas, terapêuticos),
mas ler sobre tal pelos olhos da Psicanálise me pareceu inédito, diferente.
Nunca se sabe o que há de mais para se conhecer e foi assim que O Fantástico Universo do Ser Humano me chamou
atenção.
Não existe outra fonte de saber sobre nós mesmos, além de nós mesmos.
Podemos olhar e registrar com algum detalhamento a existência do mundo externo. Temos alguma capacidade de observar o nosso organismo funcionando e até deduzir supostas causas das nossas emoções.
É
perceptível o fascínio de Carlos Holthausen pelo ser humano. E ele faz de tudo
para nos mostrar como somos marcados pelas experiências desde o nascimento,
mesmo sem termos noção alguma do que está acontecendo. Em uma primeira
instância (“a alienação da semente”), o tour
faz um apanhado histórico-cultural apresentando a sociedade em seus
primórdios, o desenvolvimento humano pelo tempo, a separação do homem do
animal, a construção de ideologias e a constituição do emocional; em uma
segunda instância (“a depressão da flor”), ele segue viagem ao interior do ser.
A
escrita de Carlos é excelente. Claro que quem tem costume de ler pesquisas
científicas vai deslizar fácil pelas páginas numa fluidez mega rápida; já
leigos podem se perder um pouco, pois, embora firme, o tom formal e acadêmico
prevalece. Poucos são os momentos que o autor divaga e conta uma história para
situar a questão debatida.
Foram
nestes momentos, inclusive, que imaginei que o autor exploraria histórias para
chamar atenção e transmitir mais empatia. Elas, no entanto, reforçaram uma
visão muito particular da psicanálise da qual não sou muito fã. Fala-se
bastante de desejo e satisfação, relação de falta e presença, prazeres e posse,
constituição do ser enquanto ainda bebê, resumido no pleno relacionamento com a
mãe. Algumas passagens até lembram bem o realismo-naturalismo,
em que se veem explicações ultra deterministas para esclarecer sobre o
comportamento do homem em sociedade.
Nossos desejos dependem muito mais das oportunidades, oferecidas pelo habitat geopolítico, econômico e cultural em que nascemos e vivemos do que da nossa capacidade de tomar decisões, pautados no suposto livre-arbítrio.
[...] não podemos concordar com o pensamento de que cada pessoa, ao viver, constrói um caminho, simplesmente porque quando andamos na vida com um objetivo, que seria o motivo para construirmos um caminho, estamos indo atrás de tal objetivo cegos por ele. Dizendo de outra maneira, é o desejo que nos conduz e não nós que conduzimos o desejo.
Nesse
sentido, o fantástico universo do ser humano pauta-se mais por egoísmo,
egocentrismo e insensibilidade, detendo-se às emoções básicas que só
descarregamos. Enquanto disserta avidamente sobre os “limites” do ser humano, Carlos
trata o ser quase como mero boneco suscetível aos seus desejos. Não se valoriza
a autossuficiência, a autoconfiança, menos ainda o respeito.
Quanto
aos vínculos, então, a visão (principalmente do mal-estar social) se mostrou
nada empática e até antiquada, a ponto de banalizar a depressão e suicídio. Livre-arbítrio
e fé também não escapam dessa egolatria.
Assim, podemos dizer que a fé é um adereço ao desejo humano, ela pode também ser aceita como intrínseca a nossa constituição pelo outro, pois, se as emoções do nosso constituinte, que nos são transmitidas pela sua linguagem, não forem regadas pela fé, elas, as emoções e suas representações, não serão reconhecidas como verdades. Assim, a nossa necessidade da fé seria a mesma de existir de verdade.
Em
sua fluidez, os pontos de vista são interessantes de conhecer, nem tanto de
aplicar. Quer dizer, é uma maneira de compreender o eu, porém, não consigo me limitar a esperar isso do ser humano. E
justo por ser humano, temos a oportunidade de expandir, de mudar, de melhorar.
Em
O Fantástico Universo do Ser Humano,
encontramos uma compreensão bem ególatra, em claro culto e fascínio do eu, este
individualista em saciar seus desejos. Neste campo, não se exploram emoções
para além do eu, tampouco grandes conflitos do momento contemporâneo. É um
traço bastante particular, indicado para os curiosos da ciência e fãs da
Psicanálise.
[...] a grande maioria de nós sequer teve ou tem a chance de conhecer algo significativo sobre a sua existência antes de morrer, além dos dogmas da fé religiosa, que, exatamente, por esta falta de conhecimento, se solidificam, pela cultura de cada momento, como verdades absolutas e, aparentemente, necessárias, principalmente nos primórdios da humanidade, digamos, de passagem.
Ao descortinarmos a janela das possibilidades do nosso saber, observando os dados e as informações de que dispomos sobre o nosso Universo e especialmente sobre o ser humano, sentimo-nos tão insignificantes que a primeira vontade que aparece é a de fechar a cortina e continuar simplesmente respirando.
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Até a próxima!
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