sexta-feira, 4 de maio de 2018

Resenha: "O Clube dos Oito" (Daniel Handler)

Tradução de Fabricio Waltrick

Aviso de gatilho: este livro possui cenas de estupro e violência explícita.

Por Stephanie: O gênero (ou classificação comercial) Young Adult, também conhecido como YA, é um dos mais populares hoje em dia. Mas lá em 1999, ano de publicação de O Clube dos Oito, a coisa era bem diferente. Claro que a literatura infanto-juvenil sempre existiu, mas não com as características específicas que aproximam a obra de um público-alvo adolescente. E é por isso que arrisco afirmar que a estreia de Daniel Handler foi um dos precursores dos livros contemporâneos para jovens adultos.

O livro conta a história de Flannery Culp, uma garota acusada de cometer um assassinato quando estava em seu último ano do Ensino Médio. O crime teria sido motivado por um suposto culto satânico envolvendo seu grupo de amigos denominado Clube dos Oito, além de outros fatores ocultistas e bizarros.

Através de seu diário, Flannery nos conta (com muito sarcasmo) os acontecimentos dos dias anteriores ao assassinato e um pouco sobre sua vida atualmente, agora já condenada e encarcerada. Esse modelo de narrativa hoje em dia já é bem comum, mas acredito que contar a história através de um diário foi um dos pontos diferenciais da obra de Handler na época de seu lançamento.

Flannery é a típica narradora não-confiável e difícil de gostar. No começo eu tive muita dificuldade no andamento dos capítulos, já que a voz da protagonista me incomodava muito. A garota quase chega a ser intragável, de tão fútil e reclamona. Aos poucos foi ficando mais tranquilo, mas não por conta de Flannery, que continuou chata, e sim por causa da dinâmica entre os amigos do Clube dos Oito que, apesar de bizarra, me entreteve bastante.

É necessário ter em mente durante toda a leitura o fato de que a obra foi escrita no final dos anos 90, ou seja, não se pode criticar o livro se baseando em YA’s contemporâneos atuais. É difícil exigir representatividade e diversidade em uma época em que isso era pouco debatido em livros para jovens. Não estou dizendo que é motivo para perdoarmos qualquer preconceito, mas eu tive que relevar algumas coisinhas em relação aos conflitos do livro para que a experiência fosse a mais positiva possível.
(...) Talvez os jovens de gerações anteriores se rebelassem por algum motivo mais óbvio, mas hoje sabemos que estamos simplesmente nos rebelando. Entre filmes para adolescentes e livros de educação sexual, estamos tão ansiosos pela nossa fase rebelde que é inevitável sentir que ela é segura, controlada. Tudo vai acabar bem, apesar dos riscos, aconchegados dentro da proteção da narrativa rebelde. (...)
Explicando melhor o que eu quis dizer no parágrafo anterior: Flannery é uma garota extremamente preocupada com sua aparência; ela afirma diversas vezes que é gorda (o que provavelmente é mentira, visto os comentários de seus amigos) e chega a ficar sem comer em várias passagens do livro, mesmo sentindo fome. Ela também xinga outras garotas de coisas como “vaca gorda”, que é algo bem gordofóbico. Não consegui entender até que ponto esses eram pensamentos apenas da personagem ou que também refletem a opinião do autor. Por isso foi um pouco difícil analisar de maneira neutra.

A rivalidade feminina também existe em grande quantidade em O Clube dos Oito. As meninas brigam bastante por conta de ciúmes de seus pretendentes, e chega até a ser cansativo. Mais uma vez, esse tipo de conflito pode até ser aceitável lá em 1999, mas hoje em dia é algo pouco verossímil.

O Clube dos Oito também debate a liberdade e rebeldia de adolescentes ricos e com pouca supervisão de adultos, algo que até mesmo nos dias de hoje é um assunto relevante. É fácil perceber a ironia do autor em representar a ausência dos pais de todos os adolescentes, tal como a presença constante e às vezes um pouco invasiva da escola e de seus professores.

Por fim, outro assunto importante que ganha destaque na obra é a distorção dos fatos pela mídia. Vemos diversas passagens de programas de TV, livros e jornais que fizeram a cobertura do caso e como é fácil canonizar a vítima e demonizar o criminoso da forma mais exagerada possível. Lendo o relato de Flannery é possível enxergar a discrepância entre os fatos e o que é exposto para o público.

O desfecho de O Clube dos Oito tem uma reviravolta que me pegou de surpresa; Daniel Handler não fez muito esforço para esconder a revelação mas acho que eu estava tão curiosa pra saber como o assassinato tinha acontecido que deixei passar várias dicas. Os mais atentos vão conseguir sacar com muita facilidade.
(...) A verdade se escondia em mim como um peixe cauteloso, suspeitando que qualquer sombra é uma rede que vai capturá-lo e trazê-lo à luz. (...)
Recomendo a leitura para quem curte humor negro, sarcasmo e personagens repletos de defeitos. Depois da metade é uma leitura bem fluida e que entretém o leitor, e que com sorte, pode conseguir surpreender no final.

Até a próxima, pessoal!
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Ana Liberato